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terça-feira, 7 de junho de 2016

Turismo sexual : do lazer ao caos




No Brasil existe uma expressão chamada ‘ amor de verão ‘ ou ‘ amor que não sobe a serra ‘ mais usada no sul/sudeste do país. Essa expressão é usada para se referir a uma paixão que não tem continuidade, que aconteceu em um certo período de tempo e não prosseguiu. Um flerte , um crush no qual não há obrigação de se tornar compromisso. Isso acontece nas férias, por exemplo, em passeios, em viagens à turismo. Existem destinos turísticos procurados exatamente por essa característica de proporcionar ao turista um relacionamento sem compromisso, além de experiências de “liberdade” e de curtir a vida. É o caso de lugares como Ibiza, Cotê d’azur, Las Vegas, de festivais de Raves e carnavais no mundo e no Brasil. Esses lugares costumam ter o vislumbre de que tudo é orgia e de que tudo é fácil mediante uma pretensa liberdade sexual. E em torno desse ambiente é que surgiu o turismo sexual. Essa é uma prática muito controversa e discutida no meio acadêmico. Nele está contido todo um imaginário sobre o outro, cheio de preconceito e ignorância.



A prática acontece especialmente de uma demanda advinda de países desenvolvidos para países subdesenvolvidos. E existem várias razões para isso acontecer. A primeira é o gasto, relativamente alto que atrai moedas estrangeiras como o dólar, em um lugar onde a moeda local é comparativamente desvalorizada. Outro motivo são fatores históricos relacionados à escravidão, predominância racial, padrões religiosos de comportamento e como algumas culturas tendem a ser sexualmente mais permissivas. Por exemplo: A cultura europeia foi, e talvez ainda seja em alguns lugares, acostumada a casamentos que não tem como ponto central a união pelo amor, a satisfação de estar junto e o mútuo consentimento. 

O período feudal foi uma época em que o casamento era realizado para unir famílias, títulos de nobreza, enriquecimento e manutenção de bens e riquezas. A manutenção da pureza feminina para não gerar descendentes bastardos e as prendas femininas para conservar o casamento, com poucas ambições que não fossem cuidar da casa e do marido. Nessa época não importavam, o amor, beleza, atração nem sequer a diferença de idade, já que adolescentes eram apresentadas à sociedade em bailes de comemoração de 15 anos (sim a origem dessa festa juvenil era apresentar a garota como pretendente ao casamento). Padrões de roupas, etiquetas, comportamento e a função sexual de gerar herdeiro foram convenções religiosas que não se aplicaram a plebe ou a cultura africana, por exemplo, onde essa tal de liberdade nada mais é do que o consentimento e que foi usada por muitos séculos como mão-de-obra e objeto.


Essa estrutura europeia é o que dá vazão a praticas desde a violência, como a declaração de posse da “escrava” com a justificativa que o corpo da mulher pertence ao seu senhor, que a alimenta. A escravidão na maioria dos países já foi abolida, mas a pobreza ainda não. Nesse ponto que colide a cultura feudal europeia com a fantasia, também europeia, de príncipe encantado. E a referência ao conto de fadas se dá ao fato desde a ingenuidade de ser uma “plebeia” ‘amada’, ‘cuidada’ e ‘reconhecida’ por um lorde rico e do qual em seu próprio país costuma rejeita-la, tendo as diferenças de classes sociais como prerrogativa. Em torno dessa conjectura que se configura a ‘oferta’ e a ‘demanda’ do turismo sexual como negócio. Nesse meio termo alguém lucra com a fantasia de mudança de vida de um lado e o desejo de ser admirado, bajulado e quisto com a devida submissão atribuída a um lorde. Nesse ponto o encontro, a procura deixou de ser genuinamente interessada para se tornar corriqueiramente interesseira. Destinos como Tailândia, América Central, Filipinas, África, América do sul, Brasil, se tornaram roteiros seja por aventura erótica ou pela busca de uma ‘companheira’ que seja prendada e submissa.


Movimentos feministas europeus e até a independência financeira são fatores que mudaram o comportamento das mulheres europeias, que se recusam a aceitar o critério masculino de conviver socialmente, segundo os padrões tradicionais.


Isso influência? Sim. Na maioria das vezes, por dois fatores:

“Historicamente, em todos os países, as mulheres têm ocupado uma posição subordinada em relação aos homens, estando em situação de desvantagem no mercado de trabalho e, assim, auferindo rendas sempre inferiores:”

“Por isso mesmo, o comércio do sexo, através da história e em diferentes países, tem-se baseado, sobretudo em uma divisão sexual do trabalho na qual as mulheres aparecem como mercadorias a serem compradas e os homens como compradores”.


Mesmo que não seja em uma real condição de escravidão, a posição inferior em comparação aos homens coloca a mulher em uma condição passível de escolher (ou não) se colocar como objeto erótico, sem que lhe seja permitido escolher ou consentir desejar da mesma forma.


Esses homens são normalmente de países como, Suíça, Alemanha, Áustria, Itália tendo em comum algum poder aquisitivo (ou ainda que seja pobre em seu país de origem, a moeda é valorizada),  padrões machistas e por vezes violentos, pouca cultura e certo grau de ignorância, pouca realização pessoal. Alguns são casados e viajam com a intenção de conhecer boas prostitutas e baratas. Outros em busca de uma esposa submissas que atendam a seus anseios de obediência e satisfação.


Por isso é importante frisar, que mesmo em viagem ao exterior, a turista, mulher que não se reconhece como sendo vista apenas como objeto sexual ( leia-se: prostituta) e por isso corre os mesmos riscos que o do turismo sexual, iludida pela ideia de que há uma superioridade sexual e que isso é legal.


O real problema do comércio sexual é como os conceitos escravocratas e o sexismo se expressam com tamanha força, baseando suas justificativas de que a mulher não tem que escolher fazer com o próprio corpo ou escolher a quem desejar. O corpo, o objeto é uma peça de troca, um meio, uma permuta, bens cujo ganho financeiro é o que se tem em troca. A prostituição do trabalho, do ofício.
Quando o objeto em si tem mais valor que a opinião daquela que o pertence, o tráfico de mulheres passa a ser o problema.


Os movimentos hippies e a própria acentuação dos movimentos feministas, na década de 70 garantiram a mulher conquistas profissionais, conscientização. Por outro lado as buscas pelas atividades sexuais se acentuaram através do tráfico de mulheres, de países subdesenvolvidos e condições precárias.



A questão central aqui é como essas mulheres, adolescentes e crianças são aliciadas. Redes de prostituição, pornografia, rede de tráfico e turismo sexual são os meios para pratica de violação dos direitos sexuais por abusar e explorar a sexualidade alheia pela força ou coerção. Pelo menos 1.2 milhões de crianças são anualmente vítimas do tráfico e 1,8 milhões são vítimas de abuso como prostituição, pornografia ou turismo sexual. O tráfico humano gera um lucro de 12 bilhões de dólares apenas com a ‘venda’ de pessoas. Só pelas fronteiras europeias, 900 mil pessoas, sendo que 83% são mulheres e 48% são crianças.


Esse comércio se organiza da seguinte forma:

Facilitador: Aquele que faz os primeiros contatos entre as mulheres, com promessas de boa vida, de se tornar bailarina, de dinheiro fácil,etc.

Agenciador: responsável pelo aliciamento para os casamentos arranjados e programas.

As mulheres: As que são efetivamente prostitutas e as que são aliciadas com falsas promessas.

Os turistas: Alemães, Suícos, Italianos, Espanhois e seus conceitos pré concebidos sobre mulheres de países subdesenvolvidos.


A partir dessa informação é possível se prevenir para não cair na armadilha do ego a respeito de turistas que muitas mulheres, inadvertidamente constroem e reforçam estereótipos dos quais rejeita. Isso descontrói também aquela imagem de homem perfeito, quando se reconhecem suas reais intenções e quão perigoso isso pode ser. Mesmo na ignorância sobre o quão violento é o tráfico de mulheres em países subdesenvolvidos, é possível presenciar homens com discursos carregados de preconceitos violentos que fazem questão de perpetuar. Obviamente, não é uma regra, e não se aplica só a turistas. Não é sobre aceitar um jantar ou ir a um encontro com alguém, sem compromisso, mas sobre como o comércio e o tráfico se configuram. Isso acontece entre relação de classes sociais e em relações trabalhistas também. Mas depois saber de tudo isso, conviver e aceitar passam a ser sem graça, sem propósito. E definitivamente, mais seguro. E é aqui que a conversa sobre o feminismo realmente começa.

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